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Foto do escritorFrei Basílio de Resende ofm

QUAIS SÃO AS FOMES E OS DESEJOS DO SER HUMANO?

Atualizado: 17 de ago. de 2020


MOVIMENTO JOVEM DE CARLOS PRATES (MJCP)

– UMA IRRUPÇÃO DE JUVENTUDE NOS 90 ANOS DA PARÓQUIA

(Este artigo foi publicado na “Revista Santa Cruz”

janeiro/junho-2020, Ano 84-n.1, p. 79-90;

órgão de divulgação interna da Província Santa Cruz de Minas Gerais.)

Depoimento pessoal de Frei Basílio de Resende ofm 1974-1978


1. Introdução: um histórico pessoal


Com a permissão de meus superiores provinciais, inscrevi-me para o Vestibular Único da UFMG 1974, curso de Psicologia, com o meu nome civil, Sylvério Bosco de Resende.

O evento acontecia, anualmente, no início de janeiro, no Mineirão. Éramos, aproximados, 20.000 candidatos para 3.000 vagas; para a Psicologia, eram 20 candidatos por vaga, 3 turmas de 40 alunos cada.


No primeiro dia de exames, eram as disciplinas exatas, Matemática, Física e Química. Em minha formação humanística e clássica, pelos gabaritos, vi que fiquei com menos de 50% dos pontos disponíveis. Quis desistir de continuar com os exames. Pensei, estou eliminado; mesmo que eu consiga a máxima pontuação nas outras disciplinas. Mas, continuei.


Uma curiosidade: no ítem Língua Estrangeira, escolhi Francês. E para me preparar, não fui estudar gramática, nem vocabulário. Peguei o livrinho “La Messe Sur Le Monde”, de Teilhard de Chardin, e o traduzi. Foi a minha maior nota no Vestibular.

Fui ouvir o resultado em casa do Pacífico Guimarães.


Tinha certeza de que uma prima, inteligente e muito amiga, havia passado; esperava ouvir o nome dela, não o meu; me considerava eliminado pela minha fragilidade nas exatas. Quando o locutor, no seu estilo pausado, falou Sylvério Bosco de Resende, eu pensava que era outra pessoa, o Pacífico olhou para mim, “é você!”. O nome soou-me estranho. Eu já era Frei Basílio, desde 1957. O Vestibular e a UFMG “ressuscitaram” o Sylvério. Então de 1974 a 1978, quando telefonavam para minha casa chamando por Sylvério era da área da Universidade; quando chamavam por Frei Basílio, era da área da Igreja, comunidades ou grupos católicos, de Cursilhos ou de jovens.


2. Nomeado Vigário Paroquial da Paróquia São Francisco das Chagas


Neste período de 5 anos, fui nomeado por meus superiores para morar no Prado, numa Fraternidade inserida, na Rua Pedra Bonita, com Frei Antônio Vicente Pereira de Oliveira e, o então, Frei Arnaldo Pires Bessa. Minhas tarefas: compor a Fraternidade no Prado, estudar Psicologia e trabalhar como Vigário Paroquial na Paróquia São Francisco das Chagas em Carlos Prates.


Procurei o Pároco Frei Antônio Francisco Blankendal e ele me disse: “Nós não precisamos de você para celebrar Missas; há muitos frades no Convento. Falei com o CPP e eles pediram para você fazer algum trabalho com a pastoral dos jovens”. Na Paróquia havia dois grupos de jovens: um da Congregação Mariana e outro, o MJCP, uns 20 a 30 jovens que se reuniam aos sábados à tarde e animavam a Missa das 18h do domingo, na Matriz.


Minhas observações e metodologia pessoal de trabalho com jovens: primeiro, a rotatividade: os jovens e suas lideranças são um grupo de passagem nas paróquias. Os indivíduos adolescentes e jovens são instáveis, rotativos. Um indivíduo ou o grupo jovem, amadurece, fica adulto, vai à sua vida profissional e matrimonial. Segundo, a liderança: a liderança pode ser individual ou coletiva. A liderança individual num grupo jovem, tende a criar a noção e imagem do chefe, no autoconceito dele mesmo e na mente do grupo. O grupo tende a se identificar com o chefe, sobretudo, os membros adolescentes; ainda mais se ele for um tipo de líder autocrata. Surge o personalismo, o individualismo, a autocracia; e desenvolve-se no grupo um tipo de comportamento de passividade, de dependência do chefe; sem ele quem somos? E, ainda mais, naturalmente, o líder de jovem tende a passar, a vida dele segue, vem o namoro, casamento, estudo em outra cidade, profissão. O grupo identificado com o chefe, tende a perder sua estabilidade, sua identidade, sua consistência, não se adapta com facilidade a outros chefes. Pode haver uma certa crise de adaptação ou uma certa desintegração. Alguns podem perder seu senso de pertença ao grupo. Na liderança coletiva, acontece um pensamento e a formação de uma consciência grupal. O grupo, torna-se o sujeito, uma alma coletiva, todos os indivíduos de forma rotativa, cumprem as tarefas de cultivar e agregar as pessoas. Há um nós no processo grupal, e não um eu. Quando um membro da liderança se afasta do grupo, a cabeça pensante e o modelo de identificação do grupo permanece e a estabilidade continua.


Sempre adotei esse sistema de liderança coletiva para trabalhar com jovens. Escolhia e preparava uma liderança coletiva de 6 jovens, 3 moças e 3 rapazes; com esses preparava, com antecedência durante a semana, a reunião do grupão: quem coordenava a reunião, quem faz o acolhimento das pessoas, dava as boas vindas, qual o tema para debater e discutir com o grupo, duração e atividades diversas.


Apliquei esse método na Paróquia São Pedro Apóstolo, em Cavalcanti, Rio de Janeiro, de 1967 a 69, e, de fato, houve uma explosão do grupo de jovens na Paróquia. Lá, escolhi um dia de semana, à noite, para debate com a juventude sobre qualquer assunto. Não havia assunto proibido. Se não fosse ninguém, eu estaria lá, refletindo sobre algum tema urgente e de interesse dos jovens contemporâneos.

3. O trabalho com os jovens na Paróquia


Em Carlos Prates, apliquei esse método de trabalho com os jovens. Na quarta feira eu me encontrava com os 6 da liderança, para preparar a reunião. A reunião era aos sábados, das 14h30 às 16h30: alguém coordenava, chamava a atenção dos presentes, um momento de silêncio, saudação a todos, boas-vindas aos novos, cantava-se o hino do grupo que fora composto por um dos membros, oração, formação, leitura do Evangelho, intervalo, recreação, avisos, aniversários, atividades programadas, oração final, despedida. Entre atividades possíveis, encontro nas casas dos pais dos jovens, em geral, nos aniversários; passeios, visitas sociais a instituições.


Eu sempre estava presente na reunião, mas não dirigia. Às vezes, me davam a parte de formação: uma palestra sobre algum tema formativo (20min). O grupo cresceu rápido. Um jovem ou dupla de jovens que iam, à primeira vez, gostava do clima acontecido no grupo, convidava outros. Em pouco tempo a média de jovens, por sábado, chegou e se manteve pelos 5 anos que lá estive, a uma média de 80 jovens por sábado. O salão ficava cheio. O mesmo acontecia com a Missa das 18h, dos domingos.


Havia alguns flutuantes. Mas eram sempre bem recebidos. Não havia cobranças. A espontaneidade ordenada era a norma experimentada no grupo. Mas o grupo desenvolveu um núcleo estruturante, perseverante, permanente. Esse núcleo eram uns 30 a 40 jovens, que era como sua espinha dorsal, sua identidade, sua alma. Rapazes e moças inteligentes, atraentes, competentes.


4. Qual a explicação para o fenômeno?


Há alguma causa para esse fenômeno?


Há muitos fatores que poderiam explicar. Primeiro, o sopro do Espírito Santo, que age onde quer, sobretudo se encontra um terreno propício: mentes e corações sensíveis, unidos, receptíveis e desejantes de sua presença e ação. Os frutos aparecem.


Também, era uma época de um verdadeiro boom de movimentos de jovens, de diferentes origens, ideologias e espiritualidades: TLC (Treinamento de Liderança Cristã, orientado pelos Jesuítas), EMAÚS (Movimento de evangelização de juventude criado em São Paulo, trazido para Belo Horizonte pelo Padre João Megale da Igreja de Lourdes), REVENSO (Movimento criado pelos Frateres da Misericórdia de Padre Eustáquio, sobretudo o Frater Henrique), JUFRA (Juventude Franciscana, cujo grupo piloto era em Betim, com Frei Pedro Chiaretti), e os grupos das Paróquias e Comunidades. É provável que a maioria dos participantes e atuantes no grupo da Paróquia tenham recebido formação e encontram o suporte da energia e espiritualidade desses movimentos citados.


Talvez, possa também se explicar por uma razão antropológica: o ser humano é um ser habitado ou movido por várias fomes, necessidades e desejos, desde a infância, a adolescência, a juventude, a idade adulta e a velhice; esse ser difuso no tempo e no espaço, enquanto viver, é um ser complexo de Corpo, Alma e Espírito - o Corpo tem sua fome e seus desejos, a Alma tem sua fome e seus desejos, o Espirito tem sua fome e seus desejos – e para a pessoa sentir-se inteira, plena e satisfeita, precisa ser nutrida nessas três dimensões. O ser humano tem sede e fome de espiritualidade, intelectualidade, sociabilidade, corporalidade, sensualidade, recreação, senso do belo e do lúdico e senso do invisível; experimenta o gosto de ser criativo, de auto expressar-se, de contar algo de seu, de sentir-se importante, de sentir-se livre, de se descobrir e se experimentar e de explorar o mundo, de encontrar um sentido, de ser algo bom, belo, verdadeiro, algo que não sabe bem ainda o que será...


5. No MJCP acontecia o ser humano adolescente e jovem


E nós, - o MJCP - estávamos lidando com a faixa etária da adolescência e a juventude, com todas essas necessidades em estado de explosão, - as do corpo, as da alma, as do espírito.

  • A espiritualidade - a busca da intimidade consigo mesmo, cultivar a interioridade, a concentração, o silêncio, o alimento da alma, do seu Eu profundo, descobrir e expandir um espaço dentro de si inteiramente seu.

  • A sociabilidade - amar e ser amado, ser reconhecido e acolhido como pessoa individual importante para o grupo, encontro interpessoal e grupal, cultivar uma identidade social.

  • A corporalidade e a sensualidade - fazer uma experiência corporal, sentir o corpo sensual em movimento, olhar e ser olhado, encontrar um espaço social para a expressão corporal, admirar e ser admirado, celebrar e dançar, ouvir a voz, ver o rosto, ver e sentir o corpo em um grupo acolhedor.

  • A intelectualidade – adquirir uma noção da existência humana, ensaiar uma resposta à pergunta: quem sou, de onde vim, o que vim fazer no mundo e na história, para onde vou, qual o destino do mundo, o que é o ser humano, qual a sua tarefa no tempo e no espaço, qual o seu destino eterno?

  • A criatividade e senso do belo e do sagrado – gostar de estar criando algo belo em si, nos outros e com os outros, havia espaço para a poesia, a música, na pintura, a arte cênica, a intuição e celebração do sagrado revelado pelo homem/Deus Jesus de Nazaré, e cada um de nós e cada outra pessoa é voz, rosto, corpo, expressão, epifania e manifestação dEle, o mais belo dos humanos, a própria Bondade e Beleza encarnada. Afinal, “a beleza salvará o mundo”, disse Dostoiévski.


E isto tudo sentíamos no grupo, celebrávamos na Missa e vivíamos na vida (nos estudos, na família, no namoro, na amizade, nas caminhadas na rua, nas serenatas, nas visitas, nas manifestações políticas, nos movimentos estudantis).


O MJCP atendia e respondia a essas necessidades de forma leve, espontânea, saudável. Era um grupo amigo. Uma alma coletiva que tinha muitos rostos. Chegavam ao grupo, adolescentes tímidos, socialmente ainda canhestros, se encontravam e cresciam no grupo, e exerciam uma forma de liderança original; chegavam jovens já maduros e criativos em sua capacidade de liderança social e não encontravam reações de ciúme e rejeição. O grupo tornou-se um laboratório de lideranças, de pessoas capazes de pensar, de escrever algo significativo, de ler com inteligência um texto e bem interpretá-lo, de desenvolver a capacidade de ser socialmente generoso ou generosa umas pessoas para com outras.


Estavam integrados em suas famílias e nas famílias uns dos outros, e em outros movimentos. Alguns pais ou mães de famílias, gostavam de ver seus filhos ou filhas com os respectivos namorados no grupo, e de ir à Missa com eles.


Do grupo, participavam estudantes adolescentes, jovens de nível médio,

universitários e jovens já no mundo do trabalho.


Foram uns anos marcantes na Paróquia. Ela adquiriu um rosto jovem. A Missa das 18h, era um momento forte de vivência e experiência de espiritualidade, sociabilidade, amizade, solidariedade, misticidade da presença do Cristo dos Evangelhos, do Cristo ressuscitado presente onde os seus amigos, - e amigos entre si, - se encontravam. Um canto que era muito frequente, e que tinha um forte apelo vocacional, era o do Padre Zezinho: “Se Ouvires a Voz do Vento” e, também, o “Cio da Terra” de Milton Nascimento. Propriamente, não eram hinos ‘litúrgicos’ mas encarnavam e expressavam um espírito que se vivia na época.


6. Conclusão: E que frutos deu o grupo para a Sociedade e para a Igreja?


Apoiou muitas pessoas na travessia de suas infâncias seguras no âmbito das famílias, - através das seduções, contradições e incertezas da adolescência e juventude, - até a idade adulta e profissionalizada na sociedade. Muitas pessoas, no contexto do grupo, fizeram a sua passagem de uma existência egocêntrica e individualista para tornar-se um protagonista de um empenho político de construir uma sociedade menos injusta, indiferente ao sofrimento de tantos e de fazer sua militância de fé cristã numa comunidade.


Deste grupo criaram-se amizades que duram para a vida, brotaram amor e alianças matrimoniais, profissionais de valor na sociedade, líderes de comunidades.

Algumas lideranças e participantes do grupo - adultos, pais e avós, profissionais em tempos já de aposentadoria - ainda hoje cultivam uma amizade que dura para a vida. Têm um grupo de WhatsApp, MJCP; trocam mensagens, cumprimentam-se nos adversários, comunicam eventos, e organizam um encontro anual. Alguns já foram para a casa do Pai.


Vida que continua!


Alguns episódios anedóticos:

  • · De 17 de abril a 10 de setembro de 1974, Frei Antônio Francisco foi, de férias à Holanda. Nesse período eu presidi, em seu lugar, a Missa de domingo, às 18h. Quando ele voltou os jovens pediram a ele para eu continuar a presidir a Missa. Admirei a humildade dele e seu senso de realismo: um nativo e mais jovem, pode sintonizar melhor com os jovens. E me chamou para continuar em seu lugar.

  • · Frei Antônio Francisco era um líder forte, uma personalidade afirmativa e autoritária. Sua voz forte e tonitruante, sua constituição atlética, gigante, era uma pessoa difícil de ficar na sombra. Um dia um menino da catequese chegou em casa e perguntou à mãe: “Mãe, é verdade que Deus está em todo lugar? – Sim! Ele está dentro da gente? – Sim!” O menino pensou um pouco e disse? “Mãe, ce já pensou no tamanho de Deus que está dentro do Frei Antônio?”, Às vezes ele feria as sensibilidades do caráter brasileiro. Algumas pessoas vinham queixar-se comigo, “ele é muito duro, muito grosseiro!”. Eu dizia a ele: “Quando precisar dizer ‘Não’, diga, mas com firmeza, mas também com suavidade, sem precisar ferir ou machucar as pessoas.” Ele perguntava o que aconteceu? Eu dizia. Ele ouvia e considerava.

  • · Frei Pedro Chiaretti era o Assistente Espiritual da Jufra, em Betim, com a missão de implantarem Minas o carisma franciscano entre os jovens. A Jufra não é um movimento de jovens; é a Ordem Secular Franciscana em moldes jovens. Frei Pedro ao saber dos 80 jovens do Mjcp, a cada sábado na Paróquia, teve a ideia de implantar a Jufra neste grupo todo. Frei Antônio estava de férias, então, Frei Hildeberto o recebeu para uma reunião com grupo piloto da Jufra, eram 4 jovens. Apresentaram o projeto de integrar todo o grupo na Jufra. Frei Hildeberto argumentou que o grupo da Paróquia tinha que estar aberto para acolher jovens que ainda não tinham nem o espírito cristão e muito menos o da Jufra. Então, ele propôs, e agradecia por isto à Jufra, levar a Betim para o Treinamento Básico da Jufra (TBJ), 20 jovens da liderança do movimento, e ser, então, o franciscanismo a fonte da espiritualidade do grupo da liderança do movimento paroquial. E, de fato, de 11 a 14 de julho de 1974, 20 deles fizeram, em Betim, o TBJ.

  • · Eu cheguei em casa, no Prado, e falei com o Frei Arnaldo: “Eh, acabo de saber que estou ficando velho. Lá no grupo, duas adolescentes estavam conversando entre si, muito animadas, eu vou passando e elas me dizem: ‘sabe, Frei, o que estamos falando? O sr. é o tipo de homem que todas nós gostaríamos de ter como pai!’. Até agora, eu era o modelo do namorado que todas gostariam de ter”. Então, eu disse ao Frei, “daqui para diante, eu vou aguardar que me digam, hei, vovô!”

  • · Numa reunião com o Frei Antônio e Frei Hildeberto, eu perguntei: “Quem é aquela moça morena, alta, bonita, de longo, que vem correndo entre as adolescentes para me cumprimentar, depois da Missa?”. Frei Hildeberto ri, com certo ar maroto e pergunta: “Moça? É mãe de 4 filhos!”. Eu: “Ah, é?!!! Pois, esta mulher está meio desorientada afetivamente; ela sempre pede para falar comigo; então, eu vou aceitar conversar com ela; qualquer coisa que vocês ouvirem falar por aqui, me digam”. No domingo seguinte, após a Missa ela vem correndo, e sempre muito insinuante, me pergunta quando poderia conversar comigo. Eu lhe digo que poderia ser agora, após tirar os paramentos. Levo-a ao parlatório do convento. Já no caminho ela fez um gesto comigo, que lhe adverti com firmeza que não o fizesse. Na sala, ela me solicitou carícias. Eu lhe disse: “Desculpe, se eu lhe dei a impressão que a queria como amante, eu peço desculpa, eu lhe dei uma impressão equivocada. Eu aceitei conversar com você, como a uma irmã, como a uma amiga”. Perguntou-me se eu poderia ir à sua casa. Disse-lhe que sim, que queria conhecer seus filhos, seu marido. Antes, porém, de eu ir à sua casa, uma outra pessoa foi à minha casa, no Prado, e me disse direto: “Você não me quis. Mas agora está com outra! Você frequenta a casa dela! Você não se defende? Então é verdade!”. (Entendi, que eu já estava sendo esnobado pela outra; eu estava pisando num perigoso terreno de areia movediça: o terreno dos desejos e das fantasias, e dos ciúmes... Toda prudência era pouca!). A partir daí, só conversei com a mulher, no hall da entrada do salão onde todos pudessem nos ver; ao ser perguntado quando iria à sua casa, eu respondia que não precisava ir, que eu já frequentava sua casa...

  • · Uma encantadora adolescente de 18 anos, chegou a mim, com toda a veemência e autoridade que sua juventude e beleza pudesse demonstrar, e disse: “Frei, o sr. precisa impedir aquela mulher de vir à missa e de vir cumprimentar o sr., eu não vou deixar, porque isto vai chegar aos ouvidos do Provincial e ele vai transferir o sr. daqui, (e toda dengosa) porque o sr. é o meu guru!”. Eu lhe disse: “Primeiro, se eu estou aqui, é porque eu saí de outro lugar e vim para cá; eu posso sair daqui e ir para outro lugar. Segundo, eu não posso colocar guardas lá na porta da igreja e impedir alguém de entrar, a porta está aberta para quem quiser entrar, e você trate de se controlar! Vai ser um espetáculo muito bonito duas mulheres brigarem na igreja por causa do padre!” (Eu estava lidando agora com o terreno do ciúme e do poder)

  • · Um jovem de talento, inteligente, caráter forte e num certo sentido muito fraco, um dos fundadores do grupo antes de eu chegar, sua libido não estava sob o autodomínio de uma mente e coração cristãos... Era o primeiro a se aproximar de forma envolvente e sedutora e namorar as moças mais bonitas e inteligentes que chegavam ao grupo. Conseguia conquistá-las, seduzi-las e induzi-las a comportamentos que depois elas perdiam o senso de sua própria dignidade e sofriam amargamente em sua consciência moral. (Outro terreno ambíguo, sutil e perigoso: a vaidade e o poder narcisista do macho beija-flor de todas as flores, mas não é capaz de ser jardineiro e de cuidar ao menos de uma).

  • · Na Biblioteca da Fafich, eu estava lendo um texto. A gente percebe os movimentos, os vultos que passam, mas sem se desconcentrar ou desviar os olhos do texto. Mas uma certa visão periférica percebe o em redor. Um vulto passou pela minha mesa, voltou, parou diante da mesa, e olhava em minha direção. Levantei os olhos, era uma moça que eu não conhecia. Ela me olhava sorrindo e, com certo receio de abordar e incomodar, disse: “Dá licença...”, “Sim?!”, “Desculpe, o sr., por acaso, é padre?”, “Sou.”, “Lá da igreja São Francisco de Carlos Prates?” Eu ri, e disse: “Sim!!!”. Então veio e me deu um abraço. Era uma das participantes da Missa das 18h. Disse que sua empregada sempre ia e gostava muito. Então, convidou-a para ir um dia. Foi, e tornou-se frequente. Comentou uma série de pequenos episódios que aconteciam na celebração. Falou da “borboleta saliente!”... etc. Rimos juntos. Foi estudar e em continuei com meu texto.

Frei Basílio de Resende ofm

Noviciado São Benedito

Cx. P. 1021

39400-971 Montes Claros

Blog/noGoogle: freibasilioderesende.org


Recebi dia 22/05/2020:

“Comentários ao texto sobre o MJCP Euler de Carvalho Cruz eulerccruz@gmail.com Sun 5/24/2020

Caro Frei Basílio, boa noite.

Achei que o seu texto ficou excelente! Uma viagem no tempo e um aprofundamento da espiritualidade. Concordo com os motivos antropológicos para a existência do MJCP, nunca tinha pensado neles. Penso ter sido quase um milagre, um graça de Deus, a constelação de fatos e de pessoas que permitiu que tudo aquilo ocorresse: você, o Frei Antônio, cada um de nós, a mística do momento na igreja, a situação de opressão do país...

Além de tudo, o texto também inclui importantes reflexões suas e informações bem interessantes, que podem servir como exemplo, a seu respeito, principalmente na parte dos episódios anedóticos. Não sei nomes das pessoas que você menciona, mas imagino que o galanteador seja o xxxxx, que aliás há muitos anos não vejo. Não tenho notícias dele.


Envio em anexo duas versões do mesmo texto: uma com a marcação dos comentários e sugestões que fiz e outra sem as marcações, para o caso de você não saber como se aceita, rejeita e elimina-se a marcação.

No fim do texto acrescentei a lista de atividades em que participantes do MJCP estavam envolvidos. A fiz com base em tópicos listados pela Valéria, Ulhoa e Tonho, completando-a com as coisas de que me lembro.


Como você disse, ficou um texto grande. Mesmo que a revista não tenha espaço para publicar tudo, nós teremos um texto que conta a história do grupo, o que será muito importante para cada um de nós que recebemos a graça de dele participar.


Envio ainda um outro documento em Word com as fotos que recebi do Ulhoa.

Um grande abraço,

Atenciosamente / Best Regards

Euler de Carvalho Cruz




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1 Comment


rosairopazplena
Aug 19, 2020

Paz plena. Frei Basílio, gostei muito do texto... É ler sobre histórias da qual tivemos alguma participação. Lembro-me muito do frei Antônio Vicente, o grande matemático, estudei um ano com ele em Santos Dumont e ele, eu e o João Bosco fazíamos a prova de matemática para todo o grupo....

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